Superação e paixão por trás das 8 novas categorias do CrossFit Open

Victor Assaf (@victerie), Anne-Laure Coutenceau (@anl.c), Diego Coelho (@coelhod), Logan Aldridge (@aldridgelogan) encontraram no esporte não somente maneira de se exercitar, mas sim uma paixão. “Burpee”, “clean”, “chest to bar”, “wall ball” fazem parte do treino – ou melhor do wod – desses atletas. Se você pensou em CrossFit, quase acertou. Com uma dose extra de garra e superação, esses nomes fazem do CrossFit Adaptative – ou CrossFit Adaptado – um estilo de vida.

A prática de exercício físico para PcD (pessoas com deficiência) contrubui para a qualidade de vida de uma maneira 360°. Melhoria  da mobilidade, do equilíbrio e da força; alívio do estresse e da ansiedade; melhorias na socialização, na autovalorização e na autoimagem fazem parte dos benefícios. Os laços entre Greg Glassman, considerado o criador do CrossFit, e os paratletas vão além da prática da modalidade. Glassman teve poliomielite quando criança e, insatisfeito com os exercícios das academias que visitou, desenvolveu um treinamento baseado em exercício dinâmicos e funcionais de alta intensidade, a fim de recuperar sua força. O ex-ginasta ressalta que seu objetivo com o esporte sempre foi estimular os movimentos simples e funcionais, como levantar pesos e objetos, não importando se você tem 25 ou 75 anos.

O CrossFit Adaptative trabalha os mesmos movimentos e no mesmo ambiente da modalidade mãe, porém com adaptações dos exercícios e dos equipamentos para cada necessidade específica, a partir da criatividade e do conhecimento da biomecânica por parte do coach, muitas vezes com o auxílio de um fisioterapeuta. Nos primeiros CrossFit Open, havia três divisões de atletas: Masculino, Feminino e equipe. Em 2012, quatro grupos masters foram adicionados para homens e mulheres. Com o passar dos anos, os grupos masters cresceram e, em 2015, duas divisões “teens” foram adicionadas. No Open de março deste ano, oito novas categorias para cada gênero foram incluídas: comprometimento da extremidade superior, comprometimento da extremidade inferior, deficiência visual, baixa estatura, deficiência neuromuscular, atletas sentados (com função do quadril), atletas sentados (sem função motora do quadril), deficiência intelectual (deficiência cognitiva).

Ana Freitas: the unbreakable

“Acho que o que eu mais lido no dia a dia são os olhares. Quando estou fora do CrossFit é mais um olhar de pena ou de estranheza, mas quando estou no Cross é olhar de admiração e encantamento. Sempre vão existir barreiras, olhares e ações de pessoas que eu vou precisar lidar, infelizmente, mas no fundo eu sei que elas realmente não sabem quem eu sou e do que sou capaz.”, conta Ana Freitas (@anafreit_). Para saber mais de como a paratleta da nossa última campanha, Unbreakable, se reinventou e passou a motivar e a inspirar pessoas, conversamos com a participante da natação nas Paraolimpíadas Escolares de 2019.

Equipe AMRC CRM: “Qual a história da sua deficiência?”

Aninha: “Minha mãe descobriu que eu era uma pessoa com deficiência quando eu nasci, pra ela foi um baque enorme. Ela achou que eu iria ser dependente de alguém pro resto da vida, que eu não iria fazer nada sozinha. Mas pra alegria de todos eu superei e supero obstáculos até hoje e só tenho orgulho de quem eu me tornei e das barreiras que enfrentei basicamente sempre sozinha, desde o colégio. Então, quando eu digo “para a alegria de todos” e não me incluo é porque eu nunca duvidei em nenhum momento que eu faria qualquer coisa e seria independente.”

Equipe AMRC CRM: “Quando começou a praticar o CrossFit? Qual a sua maior dificuldade no esporte?”

Aninha: “Comecei a praticar em agosto de 2019. Acho que a minha maior dificuldade são nos exercícios mais complexos mesmo, como o snatch, o bar muscle up e o butterfly. Mas eu faço de tudo! Vou adaptando e me superando todos os dias”.

Equipe AMRC CRM: “O que o esporte significa para você?”

Aninha: “Esporte pra mim é estilo de vida, é o que me instiga e me dá empolgação pra acordar. Eu acordo e abro logo o aplicativo pra ver qual o treino do dia. Não só gosto do Cross como de esportes em geral – corrida, vôlei, basquete. É a minha alegria do dia, eu só finalizo meu dia quando eu treino, qualquer que seja a atividade, eu preciso me mexer todos os dias.”

Equipe AMRC CRM: “Quando percebeu que poderia praticar o esporte diariamente – ou até mesmo profissionalmente, em competições de CrossFit Adaptive/CrossFit Adaptado, que já existem em outros países?”

Aninha: “O primeiro esporte que eu pratiquei foi natação aos 4 anos de idade. Desde pequena eu sempre pensei “pode ser qualquer modalidade, mas seu sempre vou estar praticando algum esporte”. Desde o primeiro dia no CrossFit eu me identifiquei e quero levar esse estilo de vida para o resto da minha vida. Eu fui descobrindo através do Instagram que tem muita gente que faz o treinamento adaptado e que inclusive compete também e esse é um dos meus desejos.”

Equipe AMRC CRM: “Como é sua rotina de treinos? E seu cuidado com a saúde?”

Aninha: “Eu vou para o CrossFit sempre depois do trabalho, todos os dias. Aos sábados eu sempre tento ir e domingo é meu dia off. Desde pequena, graças a minha mãe, eu sempre tive uma alimentação equilibrada. Hoje eu tenho uma alimentação saudável durante a semana, porque eu sinto que isso impacta diretamente no meu sono e no meu rendimento no treino. Aos finais de semana eu me permito beber ou comer algo mais livre. Mas nada de neurose.”

Equipe AMRC CRM: “Qual é seu conselho para as pessoas com deficiências que querem começar alguma modalidade esportiva?”

Aninha: “O primeiro conselho de todos é: não se compare com absolutamente ninguém! Faça respeitando os limites do seu corpo e ponha em mente que você é capaz. E sempre lembrar que tudo na vida é prática, rotina é hábito, tudo vai depender de você, isoladamente de você! Cada esforço, cada tentativa, é você em dupla com a sua mente. E antes de tudo, o primeiro passo é vestir uma roupa e ir.”

Equipe AMRC CRM: “Quem são seus ídolos (dentro ou fora do esporte)?”

Aninha: “Longe de todo egocentrismo, eu me considero a minha própria inspiração/ídolo (risos), eu realmente as vezes paro pra pensar e, poxa, se não fosse eu, eu não teria feito 1% do que eu já fiz. Quando fico mal ou pra baixo eu falo comigo como se fosse outra pessoa “poxa bicho, tu não é assim, bora, levanta, acorda para vida” (risos). Mas claro que existem pessoas que me inspiram muito também. A minha família, minha fé, meus amigos e alguns atletas com deficiência também: @anl.c, @victerie, @aldridgelogan são os que eu mais acompanho. Tem um trecho de um vídeo do Snoop Dogg que ele fala “quero agradecer a mim mesmo por acreditar em mim” e é basicamente sobre isso. Focar em si mesmo e só prestar atenção pra quem torce por você e quer ver a sua evolução.”

Equipe AMRC CRM: “Não é segredo para ninguém que os atletas com deficiência precisam superar diversos obstáculos para competir. E fora das competições, quais barreiras você já enfrentou e ainda enfrenta no dia a dia?”

Aninha: “Depois que eu me conheci mais, que aprendi mais sobre mim, foi muito mais fácil lidar com as pessoas e olhares externos. Dificilmente hoje em dia aparece alguma coisa que eu realmente tenha muita dificuldade pra realizar, sempre que paro pra pensar nisso nunca sei dizer algo que hoje em dia eu travo, sabe? Sigo a minha vida normalmente e só realmente dou atenção se tirar a minha paz. Porque a visão que eu tenho de quem é preconceituoso é porque quer chamar atenção, quer se sentir melhor, elevar o ego.

Quando eu era criança, eu estava na fila de uma clínica, tentando amarar sozinha um lacinho que tinha na minha blusa. Uma senhora virou pra mim e disse “coitadinha, ela não consegue”. Minha mãe me conta que na hora eu falei “coitadinha é você” e terminei de amarrar minha blusa sozinha. Tem gente que realmente me acha coitadinha por ser ignorante mesmo, no sentindo de mal informado sabe? Nesses casos tento relevar.”

Equipe AMRC CRM: “Quais são seus próximos objetivos dentro e fora do esporte?”

Aninha: “Quero competir, viajar pra fora, ser reconhecida, inspirar as pessoas, mostrar pra todo mundo que pra tudo tem um jeito. E obviamente melhorar muuuito no meu esporte. Mas acho que o que eu mais quero é ser reconhecida pela minha força de vontade. Acho que é um conjunto. Quero inspirar pessoas que acham que são incapazes, PcD, pessoas sem deficiência, todo tipo de gente! Quero que todo mundo procure ver começando por dentro que todo mundo é capaz mesmo tendo limitações. Pessoas preguiçosas também (risos).”

Equipe AMRC CRM: “Qual o seu grande sonho?”

Aninha: “Acho que meu maior sonho é ser reconhecida mundialmente e profissionalmente como atleta de CrossFit. O foco é ser feliz a maior parte do tempo fazendo com amor e dedicação o que eu mais gosto. A realização desse sonho depende disso.”

Fontes Imagens: Victor Assaf (@victerie), Anne-Laure Coutenceau (@anl.c), Diego Coelho (@coelhod), Logan Aldridge (@aldridgelogan)

Fontes Texto: Kamon CrossFit; Qualidade de vida na deficiência: o CrossFit adaptado para usuários de cadeiras de rodas e amputados ; The Road to The Adaptive Open